Wednesday, November 17, 2010

capacidade x eficácia

Tudo estava correndo conforme o planejado. E não era justamente esse o problema?
Sentado perigosamente na beirada do terraço de um arranha-céus, um indivíduo qualquer
refletia sobre sua vida enquanto observava o contraste das infindáveis luzes da cidade com a noite escura.
E se seus planos tivessem sido mais ousados? e se tivesse arriscado um pouco mais sua aparente
estabilidade em prol da chance de avançar mais em direção às suas metas?
O fato de ser perfeitamente capaz de executar tudo o que planejar, levava-o a interminável
obrigação de fazer planos sempre, ou ser subjugado por um destino incerto.
Planejar, contudo, é só o primeiro passo. Existem ações a serem executadas em prol de uma meta
e cada uma delas exige um tipo de esforço diferente e, é claro, tempo.
Capacidade de execução, entretanto, ( e não é aí que está o âmago da questão?) não implica
100% de eficácia em todas as ações. Podemos estar preparados para evitar armadilhas ardilosas
num dia, e pisar em bosta de cachorro no outro.
Nossa eficácia portanto, apesar da capacidade permanecer inalterada, é variável. Se somos sempre
capazes, o que raios altera nossa eficácia tão rotineiramente? Era sobre esse dilema que nesse momento
figura solitária no alto do arranha-céus fritava cada mísero neurônio. Pois ele era capaz, mas nessa noite ( e
especialmente nessa maldita noite) havia sido ineficaz. Pondo abaixo assim uma meta, embora tudo houvesse corrido
como o planejado e , repito, era justamente esse o problema.

Thursday, November 04, 2010

A Flacidez de Miguel

Sim caros amigos, o Kojiro está de cara nova, o que não deve fazer muita diferença, já que não há tantas visitas assim, de qualquer forma é sempre bom mudar. Fato interessante é que o blog tem mais de 4 anos, fato fatídico é que ele está morrendo, mas quem sabe as coisas não voltam a ficar agitadas por aqui. É sempre tempo. Abaixo segue um conto que escrevi, ele é um tanto erótico, de humor saramaguiano, e detalhismo fredista. Se você é daqueles que não tem muito saco para ler contos, pode deixar um comentário mesmo assim, ao menos pra dizer que ainda visita o blog.

Um abraço.


A Flacidez de Miguel

Por que insistes no paralelismo, se tudo que te peço é um pouco de perpendicularidade?, perguntou-se Miguel, olhando para seu pênis flácido, que seguia teimoso na mesma direção de seu corpo. À sua frente, de pernas abertas, estava a mata rala de pelos pouco pudicos, porém sublimes. Não havia apenas um convite implícito, entre as grandes montanhas formadas pelas belas coxas morenas, e pelo vale que se desenhava com o declínio harmônico, do ponto máximo pontuado pelo umbigo, delicadamente desenhado, até a cavidade profana. Era uma ordem que se impunha veemente entre os corpos. Um indizível protesto de possessão, que era emitida pelas linhas pecaminosas da mulher, e questionava a demora de Miguel, que nervoso, suava. Mas o que ela não sabia era que não convinha a ser os desejos do pobre o impedimento maior para que se deixasse de enfiar o ferro em chamas, ao menos assim deveria estar, em sua receptora de prazer. Era, entretanto, o próprio instrumento mor, que, desfalecido de motivos suficientes, negava-se a prostrar-se de pé. Digo motivos, pois, por mais belo que fosse o corpo nu a sua frente o membro simplesmente não tomava vida, e sendo assim, motivos até então desconhecidos deviam existir para que o mesmo desistisse de exercer sua função prima.

Não que seja o único papel do pênis entrar no chanfro afrodítico. Mas isso foi tolice de Deus, que, possivelmente cansado de criar tantas diferentes plantas e incontáveis exemplares animais, nos dias que sucederam o ‘faça-se a luz’, limitou-se a agregar mais de uma função as coisas de menor importância. Quando, por fim, criou o pênis, poderia ele ter separado os cargos, e assim o homem mijaria por outro canto que não pelo mesmo que goza. Assim estaria distante de vez o que não serve, do prazer. Mas poderíamos nós, contrariar as idéias divinas? Talvez tenha sido esse mesmo o propósito. Do pau sairão os resíduos não aproveitados pelo corpo, pensara Deus, e também será fonte do jorro máximo do prazer, assim, o homem, que diferente do que dizem, é, assim como a maçã e sua cobra, a expressão vil do despudor, jamais esquecerá que a fonte do deleite, de tempos em tempos, também há de ser a fonte do impuro. Cheio de subliminarismo, esse nosso Deus, mas não culpemo-lo. Quando nos criou, por ingenuidade de artesão amador, achava que fazia sua maior obra. Descobriu depois a mulher.

Mas deixemos de divagar, e voltemos para Miguel. Talvez quem leia essa verídica história ache necessário conhecer melhor o homem que chamam de Miguel, haja vista que nome por nome ninguém é nada além de escolhas paternas. E Dona Clara, mãe do homem em questão, sem muitas opções, decidiu que para esta demanda, a letra ‘m’ daria um bom começo, pois dela partem os mares, as montanhas e o mundo. A segunda letra teria que demonstrar sua posição de subjugada, de assessória, e por isso Dona Clara escolheu o ‘i’, pois dele não se iniciam grandes coisas, ele era apenas incógnito, meio irrelevante e incolor. A terceira letra era a das mais importantes, pensava, pois era a consoante que daria o tom maior, depois de muito tempo decidiu que seria o ‘g’, pois ele era grande, garboso e glorioso. Para finalizar jogou algumas letras de menor valor, um ‘u’ ufanoso, um ‘e’ épico e um ‘l’ languido. Assim se formou Miguel, em título, mas não em intelecto. Sua vida, que compreende o tempo de seu nascimento até o presente momento, são, devo dizer com propriedade de quem vos escreve, que não foi nada que quadre contar, pelo contrário, pois começou enfadonha e deslizou monótona pela linha do tempo. E se o leitor persistisse na escrita de tal, mesmo que em poucas linhas, certamente as palavras e letras, veriam os pesados olhos do leitor se fecharem, amolados. Atenhamos-nos ao que delimita as mais relevantes peculiares, e deixemos o resto para outro momento. Até para não nos distanciarmos cada vez mais do mote central, que é o sexo, ou sua ausência.

O homem era um jornalista de mão e cabeça cheia. Usava sua incrível percepção para, com palavras, exprimir sua tão acertada crítica sobre a política e vida humana. Trabalhava no maior jornal da cidade, e dividia seu expediente entre as sujas páginas dirigidas ao parlamento e sua famosa coluna. De certo, poderia com muita facilidade escrever sobre o que lhe acometia naquele momento. Primeiro, como era de seu feitio jornalístico, tentaria encontrar uma linha original pela qual pudesse dissertar e depois com rápidas rabiscadas em seu bloco de notas faria de sua mais cruel experiência uma história que, mesmo comum a muitos homens, soaria inédita, tamanha a habilidade que o mesmo tinha para extrair do ordinário, detalhes, que são o valor de ouro da escrita. Mas, improvavelmente, falaria sobre aquilo, muito menos escreveria.

Estava Miguel tão perdido em divagações, que retornando ao quarto, o qual em momento algum saíra, limitou-se a mirar a morena em sua cama e dizer que aquela noite não era a da satisfação carnal. A porta de seu apartamento fechou-se com força, quando a mulher, bufando sua frustração pelos cômodos, partiu. Delicada como não era, nada disse, mas sua expressão feroz e sua linguagem corporal de pouco tato foi o suficiente para deixar o homem ainda mais para baixo, em sentido figurado, claro. Miguel este estava entre a cruz e a espada, ou melhor, entre o desejo e o relaxamento indesejável. O pior é que não estava estressado, preocupado com situação financeira, ou qualquer um desses ditos pretextos comuns dos que não ‘dão-no-coro’. Sequer doente estava, pelo contrário, apresentava uma saúde invejável, até mesmo para atletas amadores. O que o acometia era de ordem da psique, e por isso, não importava o estado de seus músculos ou a freqüência com que os exercitava. Seu problema era em fibras que não pediam nem aceitavam cobranças: o cérebro. Tão pior assim o era, pois os músculos, como o bíceps, são bastante sociáveis, e se deixam facilmente moldar por pedido ou ordem de seu portador. Já a massa cinzenta é arredia, não aceita mando e nega exposições desembestadas.

Com medo que a situação se repetisse, noutro dia mesmo, Miguel partiu a procura de um médico. Talvez na ciência encontrasse forças químicas que levantassem sua moral, que, abraçada à seu pênis, deixaria tudo em ordem. Mas a decepção não tardou a vir, pois o doutor nada constatou. À olhos clínicos, disse o especialista, ele estava perfeito. Mas isso era tudo o que não estava. Homem nenhum vive sem sexo e sexo nenhum se faz sem ereção, ou o pau começava a mirar o céu, ou a cara, de vergonha, se volta para o chão.

Rumou então à busca de outros caminhos que não o da erudição medicinal. Precisava de alguém que tratasse o intangível, foi atrás daquele que de certo seria o mais indicado para os causos de desordem mental, o psicólogo. Mas para que não se frustrasse ainda mais, a vida, penosa como é, cuidou de adiantar à Miguel que daquele mato não sairia coelho, muito menos um daqueles que férteis, desembestam a transar a torto e a direito.

Miguel estava prestes à descambar de vez para as terras áridas da depressão. Longe de lá não estava. Pode parecer exagero, ainda mais se o leitor for uma leitora, pois não apenas um par de fartos seios e uma divina racha a diferem dos homens. Elas pensam com um cérebro que não é o deles, e por isso, o enrijecer das partes púbicas as são apenas ato repetitivo, que não necessita esforço e não fundamenta a escrita deste conto. Mas garanto a elas que, falhar na hora ‘agá’, é ação abusada que não cabe comparação com nenhuma outra situação. Basta dizer que, quando não se levanta o pau, sequer ficam, os homens, a ver navios, pois todos jazem naufragados antes mesmo do velejo.

Uma meretriz, pensou o homem frouxo, deve dar fim a minha epopéia. Uma puta era a última solução, pois se nem ela, doutrinada na arte do prazer, pudesse colocar estímulo no membro desfalecido, nem mesmo reza ou macumba dariam jeito. Para não dar tiro no escuro, decidiu consultar em todos os cantos e com todos os conhecidos, a melhor profissional do sexo da cidade. Só depois de muito listar é que chegou a um pequeno elenco de três mulheres. Como não sabia qual procurar, julgou melhor ser de total franqueza com a primeira do rol, e assim sucedeu dele dizer Alô, e do outro lado a resposta feminina: Marta, especialista em sexo, como posso lhe dar prazer? Me chamo Manoel, mentiu Miguel, como todo e qualquer homem que fala pela primeira vez com uma prostituta, Olá Manoel, Sei que é pedir demais, mas será que poderia me tirar uma dúvida? Olha querido, a voz se tornara impaciente, eu cobro pra transar, pra tirar dúvida nada lucro, então não me interessa dar resposta alguma, Mas é caso de vida ou morte, bem ao menos é como se aparece pra mim, Tardas a dizer logo então, que tempo de foda não se perde ao telefone, Meu negócio não cresce mais, Está falando de pau ou de empresa? Pois de empresa não entendo, De pau, De pau entendo, Então me ajuda, Querido se o teu problema é subir você precisa ir com uma especialista, Por isso mesmo decidi perguntar para você quem devo procurar, Miguel citou então os outros dois nomes que estavam em sua seleta lista, Amor, essas que você disse são as melhores do ramo, mas só trabalham com pau pronto, para você nenhuma delas serve, Nem a ti, perguntou, Nem a mim, você precisa é de serviço brabo, por isso deve procurar Zuleida Paixão, Ela é boa mesmo?, Só não levanta defunto porque esses não podem pagar, Então é ela. Sem delongas a meretriz passou o endereço de Zuleida Paixão, a levantadora de cobras, e o homem de nome falso desligou.

Não morava na cidade a tal da última solução. Foram precisos alguns minutos em estrada de chão até chegar à uma pequena chácara, onde a placa dizia ‘Recanto da Paixão’, deveria ser lá. Miguel já esquecido de seus modos, entrou sem fazer cerimônias pela porteira aberta, quem o recebeu, porém, foi um negro enorme, que vestia apenas uma calça branca, parecia um capoeirista ou um escravo de senzala. Que queres?, Procuro Zuleida, E qual é o teu problema?, É particular, Entrou na chácara sem pedir licença, o mínimo que deve é uma resposta, Não acho que nada devo, mas já não tenho muita dignidade para defender, venho por motivos de sexo, Imaginei que fosse, por muitos interesses procuram Zuleida, mas homem só vem até aqui por razão da carne, E muitos vem, perguntou Miguel, De tempos em tempos, E ela resolve todos?, Não saberia dizer, pois não deitam à cama comigo. Dando as costas, o negro deu fim a prosa, e com um sinal da mão, pediu que Miguel o acompanhasse.

Os dois entraram em uma pequena paliçada, lá dentro estava Zuleida, uma mulher de pele escura como a noite, lábios carnudos e cabelos encaracolados até a cintura, estava de cócoras segurando uma longa folha de bananeira. Usava longos colares de infinitas pedras e um vestido amarelo terra, que deixavam pouco evidente seus quarenta e poucos anos. Com um movimento da cabeça ela fez com que o capoeirista saísse da tenda, ficando a sós com o estranho, seus olhos grandes estavam compenetrados na fumaça suave que se levantava de um apanhado de ervas que queimava numa fogueira improvisada no chão. O cheiro era forte e doce. Tem problema para levantar?, Como sabe? Já está estampado na minha face?, Homem que vem até a minha chácara só quer uma coisa, Não ei de ser diferente, Então te sentas, e apontou para uma velha cadeira de couro de cabra. Miguel estava se sentindo incomodado com a escuridão e com a fumaça que ia se tornando mais espessa, mas não convém reclamar quando se avizinha a solução. A mulher se levantou, era mais alta do que aparentava, maior do que o capoeirista, colocou a folha defumada dentro de uma cesta de vime presa ao teto e se ajoelhou na frente do flácido. Antes mesmo que pudesse protestar, Miguel teve suas calças arrancadas com violência, ruborizou ao se ver nu, mas nada disse. Com suas grandes, porém delicadas, mãos, a mulher tomou o membro morto e o olhou atentamente, de cima a baixo, por todos os lados. Ao constatar que não havia sinal algum de rasura, desceu a cabeça em sua direção. Miguel estremeceu. Primeiro Zuleida pôs seu nariz entre os baixos e grossos fios do pentelho, inspirando lentamente o aroma libidinoso. A grande boca beijou a base do pau, e a língua correu até a glande, pôs então o pau todo em sua boca e sugou suavemente. Em choque o homem sentia pouco da boca feminina, mas a mixórdia que se dava da fusão entre a fumaça inebriante, da quimérica mulata e da penumbra fantasiosa, lançavam cortinas que iam tampando qualquer percepção cética. Aos poucos não havia problema algum, não havia mole nem duro, nem triste nem feliz, nem vivo nem morto. E a mulata sugava. Não demorou para que em riste, e por escolha própria, o pênis ficasse. Duro como ferro, foi lambido pela língua vermelha da mulher, que se enrolava no corpo quente e o molhava com saliva. Gemidos partiam dos dois, mas quase inaudíveis, tamanho era o batucar de tambores e dos trompetes que vinham de lugar nenhum. Miguel quis gozar, e Zuleida pediu que gozasse em sua boca. Quanto o clímax se aproximou, a mulher apertou forte o membro e o chupou com fogo, o orgasmo se deteve por um segundo, sabendo que era o ponto máximo, mas também o fim, e Miguel não queria parar. Mas dessas coisas não nos cabe escolhas. O gozo saiu. Zuleida sentiu o tesão do homem preencher sua boca e não desperdiçou uma gota sequer, só quando o pau foi desfalecendo lentamente é que ela desprendeu-se. O batuque cessou, a fumaça foi dispersando gradualmente. Miguel parecia acordar de um transe, estava suando frio, as mãos não paravam de tremer, mas conseguiu se concentrar para colocar novamente as calças. A mulata já estava mais uma vez acocorada frente ao fogo, com a folha de bananeira em mãos.

Estou curado, perguntou o antigo flácido.

- Fred Martins